"Jesus disse-lhes: “Guardai-vos com cuidado do
fermento dos fariseus e dos saduceus” ".
São Mateus, 16:6André Lara Resende1, ao lado de Gustavo Franco e mais alguns poucos, constitui-se num dos mais respeitados economistas do país. Em entrevista à Folha, em 15mar20, dizendo manter contatos com “lideranças políticas”, em que é citado Rodrigo Maia, mostrou ser mais um da turma keynesiana. Um típico “quantitative easier” que advoga por gastos públicos com endividamento sem restrição ou limite. Diz ele : - “. . . Estados que emitem moeda . . . Podem gastar quanto quiserem . . . até o limite em que consumo e despesas de investimento não pressionassem a capacidade de produção”.
Defende que “O Banco Central tem o poder de definir a taxa de juros abaixo da
taxa de crescimento econômico. Com isso a dívida cresceria menos do que a economia,
e os donos do dinheiro não teriam para onde fugir, a bom preço” e “. . . garantindo
assim que a relação dívida/PIB não irá explodir, ainda que haja déficits
fiscais a curto prazo”. E que com base na crise de 2008, governos emitiram
títulos, expandindo suas bases monetárias superior a 15 vezes e sem provocar
inflação : - “O experimento do chamado “quantitative easing” salvou o
sistema financeiro e implodiu a macroeconomia estabelecida”. Movido pela desculpa da pandemia de
coronavírus para levantar a bandeira de liberação de gastos, em consonância a outros
economistas inconseqüentes, defende “ação coordenada das políticas monetária e
fiscal”.
Meus
apontamentos :
(1)
Muitos economistas, após a segunda-feira, 09mar2020, em que o mundo foi surpreendido com a queda de cerca de 30% no preço do petróleo, e em meio ao vírus chinês, partiram para a defesa da
eliminação do teto de gastos. De que, por conta do vírus chinês, o
governo deveria lançar-se a imprimir dinheiro. Se "gastos do governo"
fossem a solução para a "capenga economia brasileira", a solução
keynesiana proposta teria transformado o Brasil numa
potência, pois foi exatamente o que existiu, em excesso, causando elevada
margem de endividamento público (multiplicação por 6x) ao longo de 14 anos de
PT.
O teto de gastos foi justamente a ação empregada para estancar (além da
brutal corrupção) o déficit público e seu ulterior endividamento, a cujos juros
estavam fazendo o país entrar em trajetória explosiva (isto é, em situação de
insolvência financeira e orçamentária).
(2) Em que pese o período em meio ao
vírus chinês, circunstância à qual são necessários cuidados e atenção por parte dos governos estaduais
e União, não é hora de economizar em se tratando de população, da sociedade
como um todo. Deve, portanto, o governo federal remanejar recursos de
outras áreas do orçamento visando atender demandas urgentes dos principais
ministérios envolvidos, o de Saúde e alguns correlatos, Economia (para
atendimento à indústria) e Justiça (para demandas de segurança nacional), por
exemplo. Remanejar é o primeiro passo administrativo comparativamente a
gastar emitindo dinheiro que não se arrecadou. A meu ver seria compreensível a
preocupação.
Mas Lara Resende, Monica de Bolle, Pochmann e outros partiram não para
proteger a população, mas, oportunisticamente em meio à pandemia, defenderem a
eliminação do teto de gastos e emissão de dinheiro sem limite para a
infra-estrutura (em que hospitais são parte integrante). Não houve da parte de tais economistas promoção específica de investimentos neste setor. Tampouco há lógica a emissão espúrea de dinheiro. Devem ser construídos mais deles, haja visto a rede pública hospitalar não ter acompanhado o
crescimento demográfico nas últimas décadas. Remanejamento orçamental é mais racional
que exasperar-se ou agir por oportunismo;
(3) A heterodoxia keynesiana pauta-se
unicamente em intervenção de governo com gastos e criação de moeda via endividamento.
A justificativa é a de alocação racional de recursos com base em “critérios
técnicos” para justificar unicamente intromissões e regulações econômicas com
propósitos de promover Wellfare State (Estado de bem-estar social), ou,
em outras palavras, sem a beleza de falsos eufemismos, um Estado
socialista;
(4) Fato histórico mostrou que a adoção
de política keynesiana de gastos e endividamento nem sempre é eficaz em
realidade. Como exemplo, após a crise de 1929 nos EUA, por 10 anos, entre
1930 e 1940, pouco ou nenhum resultado gerou ao menos no curto e médio prazos,
pois na tentativa de recuperação da economia o governo direcionou esforços para a infraestrutura do
país, privilegiando o setor de construção civil em detrimento dos demais. A
exceção ocorreu quando o país entrou na guerra, em 1941, em que o “esforço de
guerra” causou um choque em todo o setor privado do país, aí sim, reativando a
economia;
(5) As famílias (bem como o sistema
bancário) no Brasil estão altamente endividadas. O que já exclui a hipótese de “endividamento
até ao limite do consumo” como apregoado;
(6) O pressuposto para manter emissão de
moeda por endividamento é de que haja títulos de dívida com retornos
minimamente atraentes, apesar de considerados ativos livres de risco (a
depender da classificação de risco de cada país). No caso brasileiro, isso se
dá, principalmente, por meio de taxa de juros (Selic). Ao emitir-se títulos da dívida, ainda que
com juros reduzidos e abaixo da taxa de crescimento : (a) Quem quererá comprar
títulos se se pode investir em negócios produtivos, mais rentáveis, já que a
taxa de crescimento da economia é maior ?; (b) Como se financiará, então, o
governo sob tal hipótese ?
e (c) Havendo outras economias com juros mais
elevados por seus papéis, quem se interessará por papéis da dívida brasileira ?
Para tal pressuposto seria necessário que todas as outras economias mundiais também
mantivessem reduzidas suas taxas de juros. Como o dinheiro sempre procura quem
lhe pague mais, fuga de capitais acabaria existindo, vindo a pressionar a taxa
de câmbio, desvalorizando-a, obrigando ao governo à elevação da taxa de juros
para estancar tal fuga. Além disso, ciclos econômicos de diferentes prazos (5,
10, 15 anos ou mais) eventualmente ocorrem, causando instabilidade econômica. Em
meio a tais cenários ocorre ainda mais volatilidade, agravando o fluxo
financeiro, fazendo com que prazos de emissões sejam cada vez menores, exigido taxas
de juros cada vez mais elevadas como efeito compensatório. Esse processo conduz
internamente a economia a um processo de autofagia. Suprime-se a capacidade de
investimento das empresas, que deixam de inovar e perdem competitividade; as
exportações se reduzem; empresas tendem a falir; o desemprego aumenta e o
governo reduz sua arrecadação, ao mesmo tempo que se torna cada vez maior a
participação de pagamento de juros dos títulos, que vem a consumir mais do
orçamento, gerando déficits crônicos que necessitam ser refinanciados por
emissão de nova dívida, gerando um processo explosivo. Não é possível,
portanto, manter-se uma relação dívida/PIB controlada. O argumento é invalidado
por sí só;
(7) A simples emissão de títulos a uma
taxa de juros atraente deslocaria gastos do setor privado, voltados ao
investimento tanto para a ampliação de fábricas quanto de novas plantas
industriais (e que carregam elevado grau de incerteza e risco quanto aos seus
respectivos retornos financeiros), para a aquisição de tais títulos. A economia
como um todo deixaria de investir, crescer e gerar empregos para financiar o
governo. Seria uma medida, portanto, concentradora de renda e de desequilíbrio
social, pois não promoveria o bem estar da população mas, unicamente, o
crescimento governamental;
(8) A questão inflacionária baixa, decorrente
da expansão monetária, se deve primordialmente ao fato de que o mundo pós 2008 está
endividado e em recessão. Há um razoável grau de desemprego e que repercute com
baixa renda populacional. Portanto, por racionalidade lógica, há baixa demanda
por consumo, razão da baixa inflação;
(9) Governos expandiram em mais de 15
vezes suas bases monetárias. Mas tal expansão precisa e continua sendo paga.
Motivo da baixa capacidade de investimentos dos governos, colocando o mundo em estagnação
(ou, nas palavras de Mohamed El-Erian, “os mercados mundiais estão passando
por um período difícil que já dura anos” 2) pois além das amortizações, estão
incorrendo no pagamento de juros. Supondo que o governo brasileiro pusesse em
prática tais sugestões, mas estando o mundo estagnado, decorrente do elevado
endividamento assumido em 2008, bem como pela participação previdenciária de
uma população envelhecida na Europa, Ásia e América do norte, ainda que o
Brasil aumentasse sua produção, não teria como absorver o excedente produtivo
via consumo (pelo endividamento das famílias), tampouco como exportar. Argumentar
que o quantitative easing subverteu a teoria macroeconômica conhecida, merece
cuidado. Embora tenha sido medida paliativa necessária à época para evitar um
colapso econômico, por outro está claro o “arrastar de correntes”
macroeconômico deixado como herança aos países que o adotaram, cujos juros e
amortizações decorrentes do elevado endividamento vêm comprometendo a
capacidade de investimento dos mesmos, bem como o crescimento de suas economias.
Portanto, embora o presente cenário
esteja longe de ser o ideal, devemos considerar que choques “cardíacos” para
ressuscitar o país tendem mais a causar problemas futuros que imperiosamente
virem a favorecê-lo. Diferente do que se tem feito a partir das premissas de
Liberalismo Econômico através do ministro Guedes, de crescimento lento porém
sustentado, respeitando o aspecto fiscal dos gastos públicos em equilíbrio às
receitas. Portanto, nada admissível a aventura, ufanista e psicodélica do keynesianista Lara
Rezende, de caráter financeiro pelo Estado sem quaisquer restrições, com
investimentos públicos aprovados fora do orçamento e com base no
simples aumento da produtividade; uma arapuca !
Referências :
(1). https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2020/03/liberalismo-primitivo-de-guedes-nao-leva-a-crescimento-diz-lara resende.shtml
(2). Mohamed El-Erian, 09mar2020, Financial Times – Opinião Economia Global - “Como esse colapso do mercado é diferente de 2008 e o mesmo”.
Eduardo Mendonça de Lima
Ex-Aspirante a Oficial pela PMDF, Bacharel em Economia (UCB-1996), pós-graduado em Administração Financeira, e em Análise, Elaboração e Avaliação de Projetos, pela FGV-Brasília (1997 / 1999, respectivamente). Cursou o mestrado em Economia do Desenvolvimento pela PUCRS (2005-2007). Ex-integrante da Unidade de Projetos - Geipot (Min. Transportes) e UAP/ABC (Min. das Relações Exteriores). Atuou em empresas de porte do setor privado. Atualmente é avaliador de Empresas e perito judicial. Foi docente em cursos de pós-graduação em Macroeconomia e Valuation. Ex-Conselheiro do Corecon-RS, período 2010-2016.
Ex-Aspirante a Oficial pela PMDF, Bacharel em Economia (UCB-1996), pós-graduado em Administração Financeira, e em Análise, Elaboração e Avaliação de Projetos, pela FGV-Brasília (1997 / 1999, respectivamente). Cursou o mestrado em Economia do Desenvolvimento pela PUCRS (2005-2007). Ex-integrante da Unidade de Projetos - Geipot (Min. Transportes) e UAP/ABC (Min. das Relações Exteriores). Atuou em empresas de porte do setor privado. Atualmente é avaliador de Empresas e perito judicial. Foi docente em cursos de pós-graduação em Macroeconomia e Valuation. Ex-Conselheiro do Corecon-RS, período 2010-2016.